7x1 Carnavalize: Sete enredos bem doidos e geniais de JoĆ£osinho Trinta

by - outubro 22, 2016

por Leonardo Antan



Maranhense, baixinho, arretado, genial, artista. JoĆ£osinho Trinta Ć© uma daquelas figuras que surgem poucas vezes na HistĆ³ria. ResponsĆ”vel por uma revoluĆ§Ć£o nos desfiles, este mestre realizou grandes inovaƧƵes como a introduĆ§Ć£o de novos materiais, verticalizaĆ§Ć£o das alegorias e fantasias, protagonismo absoluto do carnavalesco. No enredo deixou sua maior marca, a introduĆ§Ć£o do carĆ”ter onĆ­rico nos enredos entĆ£o histĆ³ricos. Com Trinta, as histĆ³rias cantadas passaram a fazer as mais doidas conexƵes, indo do Egito a Lapa em alas. Dentre tantas obras primas, nos escolhemos os sete enredos mais loucos desse gĆŖnio. Por isso, aperte os cintos e venha voar com a gente.

O rei de FranƧa na Ilha da assombraĆ§Ć£o - Salgueiro 1974



Depois de integrar a revolucionĆ”ria equipe salgueirense liderada por Arlindo Rodrigues e Pamplona, o entĆ£o bailarino do Municipal foi promovido de assistente a carnavalesco na Academia. Em seu primeiro carnaval solo, ele fez uma inusitada ponte Ć”rea entre o MaranhĆ£o e a FranƧa. No enredo, o jovem rei LuĆ­s XIII ouve as lendas folclĆ³ricas maranhenses de uma preta velha e na imaginaĆ§Ć£o do menino o castelo da FranƧa se torna na prĆ³pria capital nordestina, com direito a candelabros que viram palmeiras. Esse maravilhoso delĆ­rio Ć© muito bem sintetizado no samba-enredo da escola:



VovĆ³ e o Rei da SaturnĆ”lia na Corte Egipciana - Beija-Flor 1977



Depois de dois tĆ­tulos na Academia, o carnavalesco se mudou para entĆ£o inexpressiva Beija-Flor de NilĆ³polis. Contrariando todas as expectativas, a escola da Baixada marca um processo importante na histĆ³ria carnavalesca, seu tricampeonato encerra o fim da era das chamadas "4 grandes" (Portela, Mangueira, ImpĆ©rio e Salgueiro que sempre eram campeĆ£s). O enredo de 1977 Ć© o mais divertido dessa sequĆŖncia. Para contar a histĆ³ria do carnaval desde os tempos mais remotos, a narrativa usa a figura de uma vovĆ³ que diante de uma transmissĆ£o de um desfile relembra saudosa a histĆ³ria da folia. Passando por Egito, GrĆ©cia, Roma, a viagem desembarca no Rio atravĆ©s dos ranchos e grandes sociedades. O final nĆ£o poderia ser outro: a vovĆ³ termina sambando com a Beija-Flor na avenida.



A Lapa de AdĆ£o e Eva - Beija-Flor 1985


E se as histĆ³rias bĆ­blicas tivessem acontecido no Rio de Janeiro? Baseado num livro que afirma que as rochas cariocas sĆ£o as mais antigas da Terra, JoĆ£osinho transportou personagens como AdĆ£o e Eva para a realidade carioca. Na imaginaĆ§Ć£o do artista, a serpente era Madame SatĆ£, a Lapa e a PraƧa Tiradentes eram Sodoma e Gomorra e o ParaĆ­so era povoado pelos blocos Cacique de Ramos e Bafo da OnƧa que viviam numa animada guerra. Depois de apresentaƧƵes medianas, o ano de 1985 marca o retorno da forƧa de NilĆ³polis e garantiu o segundo lugar a escola. 


Alice no Brasil das Maravilhas - Beija-Flor 1991



AtrĆ”s do coelhinho apressado, Alice caiu no buraco e encontrou... o  Brasil. Baseado numa exposiĆ§Ć£o que realizou em 1989, JoĆ£osinho transportou as aventuras criadas por Lewis Carroll para o Brasil de sua Ć©poca. Com vĆ”rias analogias inspiradas, o enredo nĆ£o poupou crĆ­ticas a polĆ­tica e a sociedade. O genial "ChĆ” dos omissos", por exemplo, fazia uma crĆ­tica as elites atravĆ©s da figura do Chapeleiro Maluco. Mesmo com o grande enredo, o desfile nĆ£o figura entre os maiores da histĆ³ria da folia. No inĆ­cio dos anos 1990, com a perda de seu figurinista Viriato Ferreira, a estĆ©tica dos carnavais de JoĆ£osinho jĆ” era mais a mesma de tempos atrĆ”s.



O Rei e os trĆŖs espantos de Debret - Viradouro 1995



Depois que partiu das terras nilopolitanas apĆ³s a histĆ³rica marca de 17 desfiles assinados e cinco tĆ­tulos, o mestre surrealista foi dĆ” expediente do outro lado da baĆ­a de Guanabara. No seu segundo ano na agremiaĆ§Ć£o, ele desenvolveu uma homenagem ao artista francĆŖs Jean-Baptiste Deprete bem ao seu estilo. No delĆ­rio, o principal nome da missĆ£o artĆ­stica francesa viveu trĆŖs espantos distintos. O primeiro deles, de encantamento. ao vislumbrar a paisagem brasileira quando desembarcou por aqui. O segundo, de consternaĆ§Ć£o, reencarnado num parisiense contemporĆ¢neo, Debret se espanta com a situaĆ§Ć£o polĆ­tica e social de sua Ć©poca. Por fim o deslumbramento, o francĆŖs assiste animado ao desfile da Viradouro na SapucaĆ­. Haja espanto!


Orfeu - O Negro do Carnaval - Viradouro 1998



ApĆ³s o histĆ³rico tĆ­tulo de 1997, o Ćŗnico atĆ© hoje da vermelho e branco, o carnavalesco das ideias mirabolantes criou mais uma histĆ³ria cheia de camadas e significados. Orfeu contava trĆŖs enredos ao mesmo tempo, numa metalinguagem, uma escola de samba dentro da escola de samba. Na primeira camada, havia o mito grego de Orfeu e EurĆ­pes, depois a peƧa "O Orfeu negro", de VinĆ­cius de Moraes que transportava a histĆ³ria para uma favela carioca. Este Orfeu carioca era compositor de escola de samba e seu samba embalaria o desfile de uma agremiaĆ§Ć£o que contaria a histĆ³ria do carnaval, fechando assim a Ćŗltima parte do enredo. O samba soube sintetizar esse grande rocambole de uma maneira leve e genial. Apesar do favoritismo, escola terminou apenas no 5Āŗ lugar.



Gentileza X - O profeta do Fogo - Grande Rio 2001



Na sua Ćŗltima grande passagem por uma escola, o carnavalesco deu expediente na tricolor da baixada de 2001 a 2004. JĆ” na sua estreia, tirou da manga uma homenagem ao profeta Gentileza, famoso por seus murais pintados no Rio de Janeiro. Mas o enredo nĆ£o seria uma simples biografia para contar a histĆ³ria do empresĆ”rio que abdicou da riqueza para virar um profeta apĆ³s o incĆŖndio de um circo. No delĆ­rio, as vĆ­timas do incĆŖndio eram a reencarnaĆ§Ć£o de romanos, alĆ©m de outras piraƧƵes. Querendo passar uma mensagem positiva no ano que marcava a virada do milĆŖnio, a apresentaĆ§Ć£o ficou marcada pelo astronauta americano que sobrevoou a SapucaĆ­.



Aprenderam como se faz um bom enredo? Primeiro tem que se livrar de qualquer vĆ­nculo histĆ³rico, depois das verdades absolutas e o mais importante: deixar a imaginaĆ§Ć£o tomar conta e fazer as mais loucos e contundentes relaƧƵes. Muito alĆ©m de Ratos e Urubus, a genialidade de JoĆ£o vale muito mais que 30.



VocĆŖ tambĆ©m vai curtir:

  1. um gĆŖnio, um rei eterno do carnaval!

    ResponderExcluir
  2. Faltou o mais marcante, de 1989...
    Ratos e Urubus
    Apresar de levar o segundo lugar, a coragem de colocar uma ala de mendigos, foi sensacional.
    Sem contar com o inusitado, que atĆ© hoje mora na memĆ³ria de quem ama carnaval, O CRISTO COBERTO, que apesar de ter sido um improviso e LaĆ­la (outro grande gĆŖnio) alegar ter sido sua ideia, foi com o aval do Mestre JoĆ£o que foi para avenida!
    Sensacional!

    ResponderExcluir