#DitaduraNuncaMais: histórias que nunca mereceram o retrato
Por Leonardo Antan e Felipe Tinoco:
Entre os dia 31 de março e 1º de abril, dia da mentira, “comemora-se” o aniversário do golpe que iniciou o período da Ditadura Civil-Militar do Brasil, iniciada em 1964. Por isso, preparamos um texto especial sobre a relação das escolas de samba com o regime militar! Para lembrar: #DitaduraNuncaMais
Já em 1967, 3 anos após o golpe, o Salgueiro seguia as tendências revolucionárias das mentes de Arlindo Rodrigues e Pamplona. O enredo "A história da liberdade no Brasil" falou das muitas revoltas populares que aconteceram no país. Os ensaios no Clube Maxwell foram visitados pelo DOPS.
Em 1969, alguns meses depois da decretação do AI-5, o Império Serrano desfilou com “Heróis da Liberdade”, em defesa da democracia. A letra sofreu censura: “é a revolução em sua legítima razão” virou “é a evolução em sua legítima razão”. Salve a Serrinha!
Em 1972, a Vila Isabel também cantou de forma valente o belo samba de Martinho em “Onde o Brasil Aprendeu a Liberdade”. Passando pela luta indígena e por movimentos abolicionistas, o desfile formou a roda para contar a história da liberdade - algo tão em falta durante a ditadura.
Entretanto, na década de 70, apesar do clima de luta conta o regime civil-militar, agremiações tentaram surfar a favor do governo ditatorial. Alguns sambas e enredos tinham óbvias alusões ao clima ufanista. À época, a Beija-Flor foi quem que mais ficou marcada por isso.
A escola de Nilópolis fez uma trilogia de temas ufanistas: Em 73, “Educação para o desenvolvimento”. Em 1974, “Brasil ano 2000”, retratando a imagem do Brasil no futuro graças ao “milagre brasileiro”. E “O grande decênio”, de 1975, comemorando dez anos do golpe.
Em 1975, o Salgueiro partiu em uma turnê pela Europa. O que ninguém sabia é que os componentes foram acompanhados secretamente pela censura federal, que acusava a agremiação de estar sob influência comunista. Saiba mais na reportagem de João Gustavo Melo:
http://abre.ai/salgueiro1975
Em 1980, na Mocidade, Fernando Pinto reinterpretou a história brasileira sob o olhar tropicalista. O setor final trazia a discussão da anistia que agitava o país. O grito de alerta surgiu em alegoria, com o congresso composto por onças ferozes, feijões e “oncetes” dos partidos.
No mesmo ano, a Vila Isabel trouxe uma obra icônica contra a censura assinada por Martinho. O samba-enredo “Sonho de um sonho”, inspirado em versos de Carlos Drummond de Andrade, trouxe críticas ao regime e clamava pela liberdade, ousando com o verso “a prisão sem tortura”.
Já em 1981, assinada por Renato Lage, a Tijuca homenageou o livro “Manuscrito Holandês”, de Manoel Cavalcanti Proença. A história da luta do herói caboclo Mitavaí contra o terrível Macobeba se tornou metáfora para falar da repressão política, do povo oprimido e de sua luta.
A Tijuca foi acompanhada pelo governo nesse carnaval. Segundo o relatório da censura: “Foi constatada a atuação de comunistas com o propósito de que o enredo veiculasse uma mensagem política”. A história completa está na reportagem de João Gustavo Melo:
Por sua vez, Luiz Fernando Reis foi um dos principais carnavalescos a trazer pautas políticas e sociais para seus enredos. Em 1984, a Caprichosos trouxe um grito pelo voto direto em uma alegoria com caricaturas de políticos da época, como Paulo Maluf, Ulysses e Tancredo Neves.
Em 1985, em período próximo ao fim da ditadura, a provocativa Caprichosos de Pilares, sob a batuta de Luiz Fernando, levou à Sapucaí “E por falar em saudade...”. No samba: “diretamente, o povo escolhia o presidente”, evocando novamente as eleições diretas e a importância do voto!
Em 1986, primeiro carnaval após o fim oficial do regime, a Serrinha traduziu todo o sentimento de esperança da redemocratização com o "Eu quero", de Renato Lage e Lilian Rabello. A simbólica letra de Aluísio Machado criticava os “20 anos que alguém comeu".
Em 1990, a Santa Cruz rememorou os tempos de regime por meio de "Os Heróis da Resistência" em um de seus sambas mais conhecidos. A escola exaltava o periódico O Pasquim, jornal alternativo que fazia oposição ao duro regime, famoso por suas entrevistas com artistas e intelectuais.
Outro desfile que lembrou um dos heróis contra a ditadura aconteceu em 96, quando o Império Serrano homenageou o sociólogo Herbert de Souza, saudoso Betinho. O tema destacou a sua firme luta pela liberdade e pelos direitos durante a ditadura - além da sua campanha contra a fome.
Em 2010, ao contar a história da música brasileira, a Mangueira não esqueceu as páginas duras da censura contra as artes. A quarta alegoria lembrou CenSolange, uma das funcionárias mais célebres da ditadura. A bateria também fez uma performance sobre a repressão.
Em 2016, ao trazer as manchas do Brasil no seu complexo enredo, a Mocidade não esqueceu de dedicar um setor aos anos de chumbo e suas mazelas por meio das belas canções de protesto de Chico Buarque, Geraldo Vandré e Caetano Veloso.
Uma curiosidade entre a relação das escolas e da censura era a necessidade de aprovar os croquis de fantasias e alegorias dos carnavalescos entregues ao regime federal. Os desenhos ganhavam um carimbo de APROVADO pelos censores. A prática seguiu até a 2ª metade da década de 80.
Encerrando a thread, em 2019, logo após um ano em que a nossa democracia foi colocada em cheque por forças reacionárias, a Mangueira exalta “quem foi de aço nos anos de chumbo” e lembra o que a ditadura foi: assassina. Na imagem, a grande Hildegard Angel, filha de Zuzu Angel:
Uma curiosidade entre a relação das escolas e da censura era a necessidade de aprovar os croquis de fantasias e alegorias dos carnavalescos entregues ao regime federal. Os desenhos ganhavam um carimbo de APROVADO pelos censores. A prática seguiu até a 2ª metade da década de 80.